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Mas eu sou como uma oliveira que floresce na casa de Deus; confio no amor de
Deus para todo o sempre. Salmo 52:8

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

5 anos e a alegria da sua lembrança

Cinco anos. Meia década se passou.

Cinco anos atrás eu estava grávida de 38 semanas. Olhava para aquela barriga enorme que escondia meus pés, onde carregava dentro de mim uma vida. Uma pequena criança envolvida em amor e ternura extremos. Eu não fazia ideia do que aconteceria. Só sabia que tinha valido a pena chegar até o final daquela gestação. 

Neste horário eu ainda não conseguira dormir. Sentia ansiedade, agitação, euforia e medo. Em poucas horas minha filha nasceria. A médica marcara a cesárea algumas horas antes e precisava chegar ao hospital às 5 da manhã. Deitada sobre o lado esquerdo do meu corpo, com uma almofada para ajudar a amortecer o peso da barriga, eu me encolhia e abraçava a mim mesma com as mãos sobre o ventre. Respirava fundo e tentava relaxar. A mente voava em pensamentos de alta frequência, muitas vozes tentavam enumerar todas as possibilidades para o futuro mas eu respirava fundo, relaxava e as silenciava. 


Eu te amo, bebê. Eu te amo. Obrigada. Nunca vou te esquecer.

Ela nasceria viva? Choraria, respiraria, viria para os meus braços? Como seria sua aparência? Seríamos bem tratadas no hospital ou hostilizadas? Seria melhor que ela sobrevivesse? Respiro e penso que não importa o que acontecer, tudo vai ficar bem. Inspiro e expiro lentamente e me sinto mais calma. O que importava era o que eu carregava dentro do meu coração. Amor. Se o coração se desesperava, pensava neste amor, pensava neste Deus que eu tinha experimentado e sentido ao longo da gestação, que me acolheu e sustentou. E o coração se acalmava. Tudo vai ficar bem.

Eu queria um milagre. Eu clamara por um milagre. Eu não queria estar vivendo aquela história. Queria viver uma outra história. Queria um bebê perfeito, saudável, sem problema algum. O bebê dos meus sonhos, idealizado, planejado, esperado. Mas ele fora roubado. Meu bebê era malformado e incompatível com a vida. Tinha dificuldade de imaginá-lo, de enxergá-lo como uma pessoa. Mas ao longo da gestação, enquanto esperava pelo que não tinha mais esperança, aprendi a amar. Percebi que precisava amar aquele bebê, era minha única chance. Nossa única chance. Minha única escolha. Meu único caminho. Aceitar. Amar. Quanta ternura encontrei nesse caminho que parecia ser só de duros e dolorosos espinhos.

Percebi que precisava deixar de lado o bebê idealizado e sonhado, parar de chorar por ele e me concentrar em amar e celebrar aquele bebê real, precioso, amado e único que abrigava junto a mim. Ou corria o risco de amar alguém que nem existia e perder a oportunidade de amar quem estaria ali junto de mim por tão pouco tempo.

Mantinha os olhos fechados, mas não sentia sono. Fazia calor, mas era uma noite fresca. Em uma mochila já colocara minhas roupas e produtos de higiene. Numa bolsa que comprara junto com as coisas do enxoval, as roupinhas da minha filha, 6 conjuntinhos de menina. A noite passou enquanto eu cochilei superficialmente por umas 2 horas. Me sentia eufórica. Todos me achariam louca, mas eu estava feliz apesar do medo. Pus uma calça jeans larguinha de gestante e uma bata branca, penteei os cabelos compridos. Tinha 27 anos e estava me tornando mãe. Uma menina. Minha filha nasceria. Tinha valido a pena viver todas estes meses junto com ela. 

Quando ela nasceu, tive mais certeza ainda do quão importante fora aquele tempo para nós. Aquela paz que senti no peito, o que era aquilo? Momentos de presença divina.

Seu choro ecoou pela sala e ficou gravado para sempre em nossa memória apesar de não haver nenhuma gravação física. Ela nasceu envolvida em fragilidade e realizou tantas coisas, tocou tantas vidas, mudou tantas histórias, nos transformou.

Enquanto eu aguardava na recuperação, de olhos fechados enquanto as lágrimas escorriam pelo canto dos olhos, não sabia o que aconteceria, por quanto tempo ela viveria. Só pensava que tinha valido a pena ter chegado até ali. Ter vivido aquela breve história de vida carregando dentro de mim uma pequena e preciosa vida durante alguns meses.

Jamais imaginaria que tantas coisas incríveis aconteceriam nos 2 anos e meio depois daquele 13 de janeiro de 2010. Como foram anos intensos, profundos, de grandes desafios e de grandes alegrias. Tive mais momentos sorrindo e vivendo horas de extremo amor e carinho de que de lágrimas. Foram poucas as ocasiões em que chorei na sua presença. Junto dela eu sentia paz, força, coragem, amor. E todas estes sentimentos me faziam bem, me curavam. Me faziam me sentir mais feliz, mesmo nas horas difíceis. Apesar de tudo. Essa certeza de que Deus estava ali conosco e que tudo estava valendo a pena. Fui eu mesma que vivi tudo isso?

Como mudei e fui transformada por aquela menininha delicada e frágil. Ao amá-la e aceitá-la, aprendi a amar e aceitar a mim mesma. Ao ser compassiva e solidária com suas imperfeições, aprendi a compreender e respeitar a mim mesma com todas as minhas imperfeições e limitações. Ao lutar e acreditar na superação dela, passei a acreditar mais em mim mesma e nos meus sonhos. Ao me sentir feliz pelo simples fato de ela estar viva, aprendi a estar feliz pelo simples fato de eu mesma estar viva. Celebrando sua vida passei a celebrar a vida como um todo, como uma dádiva divina imensurável. Apesar de tudo.




Ela viveu 2 anos e meio conosco após nascer e agora há praticamente 2 anos e meio que ela morreu. Não parece que faz tanto tempo. Parece que o tempo que ela estava conosco foi muito, muito mais longo do que o tempo da sua ausência. O tempo corria em outra frequência.

Ela se foi, mas ficou em tudo que nos ensinou. Não tenho mais a alegria de ver sua superação dia a dia aqui ao meu lado. Mas tenho a alegria de ter sua lembrança guardada no coração. De termos superado juntas tantas limitações. Não somente dela, mas minhas também. E certamente também do papai que tanto a amou e ainda ama.




Não sei por que tudo isso aconteceu comigo. Não tenho todas as respostas e nem pretendo tê-las. Só sei que eu a amei e o amor fez tudo valer a pena. 

Hoje não é um dia para chorar e pensar que é aniversário de uma filha que já morreu. É dia de celebrar a vida de uma filha que só nos deixou bênçãos, maturidade e amor. De pensar no dia em que ela nasceu, em que nossas vidas foram abençoadas pela sua vida.

Cinco anos de nossa amada e eterna Vitória de Cristo. Quanta saudade, pequenina, quanta saudade! Parabéns! Obrigada por tudo! Te amamos!!!

Mamãe, papai e Benjamin


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